Alguém espirra na China e, meses depois, um morador de rua brasileiro morre de fome.
“Mas isso não faz sentido nenhum”, muitos diriam.
Talvez você já tenha se deparado com a ideia de que “o bater de asas de uma borboleta pode causar um furacão do outro lado mundo”. Sabemos que isso não é verdade em relação à borboletas e furacões, mas será que ações aparentemente triviais não podem causar problemas de proporções inimagináveis que afetam a vida no planeta todo? É o que a pandemia do coronavírus parece demonstrar.

Imagine que o mundo está funcionando normalmente: amigos saem juntos, empresários fazem reuniões de negócios, crianças estão nas escolas, idosos jogam damas na praça e políticos continuam roubando o nosso dinheiro. Um dia normal como qualquer outro.
Do outro lado do mundo, Li Wang Zhang, um chinês de meia-idade, após muitas horas de trabalho árduo, resolve ir até a feira para almoçar. Ele então resolve modificar seus hábitos alimentares normais e decide experimentar um suculento morcego. Um amigo passa por ele, percebe que ele está comendo um morcego e brinca “isso aí vai dar merda hein”, prevendo sua provável dor de barriga. Zhang, após sua refeição, reclama com o vendedor do alimento, dizendo que estava muito ruim. Pela noite, Zhang se despede de seus companheiros de trabalho e chegando em casa abraça e beija sua esposa e filho. Alguns dias depois, a família toda tem leves sintomas de uma gripe normal. Vida que segue.
A esposa de Zhang resolve visitar sua mãe no dia posterior. As duas tomam chá, conversam sobre as dificuldades da vida e então retorna para casa. Sua mãe no outro dia, encontra algumas amigas na praça. Algumas semanas depois os hospitais começam a perceber um aumento signicativo nas internações e falecimentos por probelmas respiratários. Um novo vírus surgiu.
Alguns meses depois o vírus se espalha pelo mundo todo. Nasce uma pandemia.
Um especialista inglês resolve dar sua opinião sobre o que está acontecendo. Um determinado país não é capaz de se preparar e presencia centenas de mortes por dia. Políticos do mundo todo resolvem trancar milhões de indivíduos dentro de suas casas. Agora já não é mais possível encontrar os amigos, nem ir à escola ou jogar damas na praça. Ainda é possível roubar o pouco dinheiro que resta das pessoas. Mas somente por enquanto.
Antevendo toda a situação, um investidor decide vender todas as suas ações. Sem perspectivas de venda, inúmeras empresas fecham as suas portas. Um catador de latinhas reclama que os bares estão fechados e que já não é mais possível encontrar a fonte do seu sustento. Um morador de rua morre de fome, pois não tem mais para quem pedir dinheiro, já que as ruas estão vazias. Um pai de família aceita a proposta de assaltar o mercado da esquina da sua casa, já que agora ele não possui mais emprego, seu dinheiro está acabando e sua família está com fome.
Já não é mais possível roubar o dinheiro das pessoas, pois agora ninguém mais possui dinheiro para pagar impostos. Dessa forma, hospitais já não possuem mais os meios de atender a mesma quantidade de pessoas. A criminalidade aumenta e os policiais reclamam que não estão recebendo seus salários em dia. O páis colapsou.
É, Zhang, seu amigo estava certo: deu merda.
Esse texto não tem como objetivo predizer o futuro ou muito menos disseminar histeria, mas tão somente usar do momento atual em que vivemos para fazer um exercício de imaginação para demonstrar a interconectividade de todo o planeta e das ações dos indivíduos.

Seria possível prever tudo o que estamos passando? Talvez. Talvez somente em partes, mas não completamente. Alguém espirra na China e faz com que, meses depois, um morador de rua brasileiro morra de fome. Talvez agora não soe tão absurdo.
Em verdade, é muito limitada a nossa capacidade de prever o nosso próprio futuro e os efeitos de cada uma das ações que tomamos. Mesmo assim, alguns afirmam que têm ferramentas eficientes para cuidar do destino de milhões de indivíduos – claro, utilizando o estado como meio para isso. O economista austríaco Friedrich Hayek chamaria isso de “Arrogância Fatal”.
Tenhamos cuidado com essas pessoas, sejam elas quem forem: economistas, políticos, investidores, médicos, filósofos ou gurus. Ninguém é capaz de entender a complexidade da vida humana. Sejamos céticos. Tenhamos cuidado. Tenhamos cuidado, principalmente, com aqueles que não têm sking in the game, isto é, pessoas que dão opiniões e tomam decisões sem correr o perigo de perder alguma coisa no processo.
Autor: *Thiago Berteli
* Estudante de Ciências Econômicas pela Fadergs, foi Diretor de Eventos do Instituto Atlantos em 2017. Estagiou no IEE (Institutos de Estudos Empresariais) e atualmente trabalha no Instituto Liberdade. É sócio, editor e produtor do Tapa da Mão Invisível.